As crianças passam muito pouco tempo nos espaços exteriores dos jardins de infância e, quando o fazem, é por curtos períodos de tempo e em atividades pobres que pouco ou nada beneficiam a aprendizagem e o desenvolvimento dos mais novos. A investigação da Universidade de Aveiro (UA), a primeira em Portugal a estudar a interação das crianças com os espaços exteriores das creches e jardins de infância, aponta que os espaços exteriores e as atividades proporcionadas às crianças não promovem o desafio, a exploração, a autonomia e a liberdade, aspetos importantes no desenvolvimento da autoconfiança e do bem-estar emocional entre os mais novos.
"As crianças permanecem no exterior apenas 10,8 por cento do tempo passado no jardim de infância e por períodos curtos de tempo que em média têm 30 minutos, dedicando ao jogo livre apenas uma pequena fração desse tempo”, afirma Aida Figueiredo, investigadora do Departamento de Educação e do Centro de Investigação Didática e Tecnologia na Formação de Formadores (CIDTFF) da UA.
De facto, adianta a investigadora, “as crianças [no exterior dos jardins de infância] evidenciam pouca atividade motora, permanecendo a maior parte do tempo de pé e a andar, não existindo ações que requerem contacto do corpo com o solo, equilíbrio ou desafio, como trepar, pendurar ou balançar, percorrendo distâncias inferiores a dez metros, independentemente da área e do tipo de espaço”.
As conclusões resultam do trabalho de doutoramento da investigadora que, durante meses, analisou as interações de 16 crianças, entre os 4 e os 5 anos, com os espaços exteriores de quatro jardins de infância das cidades de Aveiro e de Coimbra. “Estes [os espaços exteriores daqueles jardins de infância] são pobres e não convidam ao movimento e à exploração", conclui Aida Figueiredo.
Ainda que o estudo se tenha centrado em quatro espaços infantis, Aida Figueiredo não tem dúvidas quanto ao cenário, em tudo semelhante, que se poderá encontrar no país. “Não se pode generalizar do ponto de vista investigativo, mas o saber empírico que detemos, a partir de supervisão de estágios, seminários e conversas informais, diz-nos que a probabilidade desta situação ser muito frequente em Portugal é elevada”, afirma a investigadora.
Se o tempo passado no exterior é curto, esse é ainda utilizado pelos educadores para atividades estruturadas, sendo o tempo dedicado ao jogo livre inferior ao das atividades orientadas pelos educadores. “A investigação demonstra que a interação das crianças com espaços exteriores diversificados, estimulantes, desafiadores, que incorporem elementos da natureza, seja terra, água, flores, folhas, pedras ou areia, e que convidem ao movimento e à exploração aumenta o seu nível de atividade física, enriquece o comportamento de jogo livre e potencia o seu desenvolvimento cognitivo, emocional e físico”, lembra Aida Figueiredo.
O jogo exploratório e o jogo construtivo, igualmente considerados importantes na infância, “surgem esporadicamente, ocorrendo em maior número aquando da interação da criança com elementos da natureza”.
Relativamente à atividade motora, aponta Aida Figueiredo, “observou-se que as crianças apresentam predominantemente ações que envolvem a parte superior do corpo (tronco, mãos e cabeça), permanecem de pé e andam, sendo pouco frequentes ações motoras mais intensas (como correr e saltar) ou com maior grau de qualidade (como trepar, equilibrar e suspender)”.
Concluiu-se, assim, “que os espaços exteriores englobados no estudo não promovem níveis elevados de atividades motora, uma vez que estas crianças percorrem em média distâncias menores ou igual a dez metros, independentemente da área do espaço, observa-se o predomínio de atividades sem intensidade e sem qualidade e as crianças têm pouco contacto com o chão ou com atividades que envolvam desafio, equilíbrio ou suspensão”.
Com base nestes resultados, aponta Aida Figueiredo, “é essencial e urgente refletir sobre o que a sociedade tem proporcionado às crianças e delinear estratégias de mudança, utilizando iniciativas integradas, articuladas e transdisciplinares, que envolvam as crianças, os pais, a comunidade e os contextos de apoio à infância”.