Portugal entre os bons exemplos da UE na gestão da água.

Água e solo não emergem como grandes preocupações nem nos planos da Comissão Europeia nas versões de 2015 e de 2020, nem nos planos dos países analisados, em comparação com os materiais ou resíduos.

A conclusão resulta de um estudo que analisa planos de nove países da União Europeia, entre os quais Portugal, assinado por investigadores da Universidade de Aveiro (UA). Mas Portugal destaca-se pela positiva.

O estudo “Policy narratives of circular economy in the EU: assessing the embeddedness of water and land in national action plans”, publicado em janeiro de 2021 no Journal of Cleaner Production, de elevado fator de impacto, conclui ainda que água e território não estão associados de forma consistente aos componentes típicos dos planos, nomeadamente a exposição de problemas, objetivos, estratégias e medidas, atores a envolver, e indicadores de desempenho.

Teresa Fidélis, investigadora unidade de investigação em Governança, Competitividade e Políticas Públicas (GOVCOPP) e professora do Departamento de Ambiente e Ordenamento (DAO), primeira autora do estudo, explica ainda: “A maioria dos planos de ação apenas menciona a água e o território na exposição de problemas e nas estratégias e medidas. Apenas metade os refere nos objetivos de economia circular e muito poucos as mencionam relativamente a stakeholders a envolver ou em indicadores para avaliar a implementação dos planos de ação”.

O artigo é assinado por vários autores.

Para além de Teresa Fidélis, também por Filipe Teles, professor do Departamento de Ciências Sociais, Políticas e do Território da UA e investigador do GOVCOPP, Andreia Cardoso, também investigadora do GOVCOPP, Ana Catarina Miranda, João Abrantes, Fayaz Riazi, os três são investigadores do DAO, e Peter Roebeling, também com afiliação à Wageningen University and Research para além de membro do Centro de Estudos do Ambiente d do Mar (CESAM), e foi desenvolvida no âmbito do projeto H2020 (Project Ô: demonstration of planning and technology tools for a circular, integrated and symbiotic use of water) em que a UA é parceira.

Considerando que o conteúdo dos documentos de política pública pode revelar a forma como determinadas preocupações estão a ser consideradas e com que prioridades, afirma Teresa Fidélis, este estudo procurou responder a duas questões.

A primeira, como é que a água e o território estão incorporados na narrativa dos planos de ação da economia circular da União Europeia. A segunda, se os planos de ação da Economia Circular dos Estados-Membros desenvolvem narrativas semelhantes às da UE ou revelam ainda mais as preocupações relacionadas com a água e a terra.

 

Portugal entre os bons exemplos

 

Foram analisados os planos de ação para a economia circular de nível nacional de nove países designadamente da Alemanha (2016), Dinamarca (2018), Espanha (2018), Finlândia (2016), França (2018), Grécia (2018), Holanda (2016), Itália (2017) e Portugal (2017). Estes eram todos os planos de nível nacional que, à data da elaboração do artigo, se encontravam disponíveis na plataforma de economia circular da União Europeia.

As preocupações relacionadas com a água estão, assinala a investigadora, mais fortemente enraizadas nos planos de ação nacionais de Portugal, Dinamarca, Espanha e Grécia, seguidos pela Itália, Holanda e Finlândia, e finalmente pela Dinamarca e França. A maior, e mais consistente, incorporação de água, contudo, é mais evidente nos planos dos países do Sul da Europa como Portugal, Grécia e Espanha, onde os níveis de escassez de água são habitualmente mais elevados.

As preocupações relacionadas com o território estão mais incorporadas nos planos de ação de França e Itália, seguidos pela Dinamarca, Portugal, Espanha e Finlândia, e por fim pelos Países Baixos, Grécia e Dinamarca. Sobre o território, em termos genéricos, “verificou-se uma frequência de termos menor e uma consistência muito mais errática”. A correlação negativa, entre termos e nível de escassez, sugere uma fraca associação entre economia circular, planeamento territorial e os problemas de escassez de água e de seca”.

Falta integração dos conceitos

A literatura da especialidade sublinha a importância da reutilização da água e da recuperação de nutrientes e do envolvimento de atores ligados ao setor da água e à sua governação. A maioria dos planos, contudo, constata Teresa Fidélis, não refletem estes aspetos de forma vincada e consistente, nem tão pouco a oportunidade de articular a economia circular com o planeamento territorial, por exemplo através da adoção de simbioses industriais.

“A relevância periférica das preocupações com a água e a terra na narrativa da economia, enfatiza as alegadas lacunas das abordagens integrativas que importa reforçar. A circularidade da água, desafio integrante da economia circular e da sustentabilidade ambiental, envolve novos circuitos de água entre diferentes localizações, novos desafios para a monitorização e governação, e novos riscos em matéria de segurança. Requer por isso atenção clara e consistente nos objetivos de política da economia circular, nas ações a desenvolver, na clara identificação dos atores a mobilizar e nos indicadores para medir a eficácia das ações. Se as preocupações com a água e a terra devem estar na vanguarda da transição para a circularidade, como recomenda a literatura, e se se espera que estes planos ofereçam uma abordagem integrada do conceito de Economia Circular, devem ser feitos mais esforços para assegurar a sua integração”, conclui.

O estudo analisou documentos, mas há inúmeras iniciativas que visam a circularidade de água em diversos países da União Europeia, incluindo Portugal. Importa também avaliar a prática gerada e alargar a análise ao modo como as regiões, municípios ou empresas estão a considerar a água e o território nas suas agendas e ações de economia circular. Este constitui um novo percurso de investigação que a equipa já está a trilhar.

O estudo está disponível através do link: https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0959652620357310

 

Texto e foto: UA