Jovens de Estarreja estão a “vigiar” a floresta.
Têm entre 16 e 25 anos, são estudantes, prescindem do seu tempo de férias, percorrem as zonas florestais, aprendem a cada quilómetro feito a duas rodas e revelam uma atitude cívica muito acima da média. São os “camisolas verdes”, que todos os anos vigiam as florestas do concelho, no âmbito do projeto “Juntos pela Floresta, Todos contra o Fogo”, promovido pela Câmara Municipal de Estarreja.
Para os jovens participantes esta é uma forma de ocupar os seus tempos livres durante as férias, adquirir novos conhecimentos e vivenciar uma experiência diferente. Foi o caso do João Marques, que “ia passar as férias sem fazer nada em casa”. Com apenas 16 anos e após uma temporada de 15 dias na floresta, a fazer vigilância, recolher lixo, identificar lixeiras, assinalar caminhos e sensibilizar a população, este jovem afirma que “somos membros da proteção civil por 15 dias. Sinto-me importante por tentar ajudar”.
Tal como o João, também Diogo Lagoeiro, 16 anos, de Pardilhó, decidiu participar porque não tem “nada para fazer durante as férias”. Integrou a Equipa da Zona e Industrial e Veiros, que colaborou com os Bombeiros Voluntários de Estarreja no rescaldo do incêndio em Pardilhó, ajudando “a localizar reacendimentos” e em tudo o que fosse necessário. Porque vestir a camisola verde é assumir um compromisso com a floresta e estes jovens levam a sua missão muito a peito.
No final da primeira temporada, que terminou a 4 de agosto, Diogo sentia que tinha cumprido o seu dever mas lamentava que “ainda há muito por fazer”, nomeadamente no que diz respeito ao lixo que é deixado de forma desmesurada na floresta.
“O lixo para recolher nunca acaba”, constatou. Esta equipa encontrou em média 1 lixeira por dia, que é identificada e posteriormente eliminada pelos serviços competentes. Incrédulo, o seu colega de equipa afirmava que “não estava à espera” de encontrar esta triste realidade. “É um combate difícil”, desabafava por sua vez o Diogo.
O elemento mais velho do grupo e com mais participações neste projeto, cinco no total, Fábio Aleixo, de 22 anos, acrescentava que “por mais quinzenas que se faça e por mais lixo que se recolha, nunca é suficiente. Vamos contribuindo mas o trabalho nunca fica completo”. A edição ainda não terminou e até agora já foram recolhidos 3060 Kg de lixo!
A sul do concelho, o cenário continua a ser desolador. “Até hoje não tinha a noção do lixo que é aqui depositado. Olho para estes exemplos e digo que não é necessário, isto é completamente desumano. Quem faz isto está a cometer atitudes irracionais. Encontra-se aqui de tudo! Não há palavras…”, afirmou com tristeza Edgar Figueira, 20 anos, de Canelas, que fez parte da Equipa Sul durante a primeira quinzena. Em algumas horas numa manhã, facilmente conseguem encher 15 sacos de lixo. “Fiquei sensibilizado e transmito a mensagem: o lixo não é para estar na floresta!”
A formação destes jovens e a sensibilização da população são aspetos fundamentais do projeto que a Câmara Municipal de Estarreja promove há 11 anos. Antes de irem para o terreno, os voluntários recebem formação com os Bombeiros Voluntários de Estarreja, com a GNR - SEPNA (Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente), parceiros fundamentais da Câmara Municipal de Estarreja neste projeto, para além de formação e acompanhamento pelo Gabinete Técnico Florestal do Município.
As ações específicas de sensibilização decorrem durante o tempo em que os jovens circulam no terreno, através do contacto direto com a população. No caso da Equipa Sul, Rui Oliveira, 21 anos, de Fermelã, dá o exemplo de uma ação com crianças no BioRia, em Salreu. “O feedback foi bom, elas gostaram a acabam por aprender alguma coisa”. Outra experiência “gratificante” aconteceu em Fermelã onde, também junto do público infantil, “desenvolveram uma atividade relacionada com a floresta”. A maior recompensa que estes jovens tiveram foi perceber que “os miúdos chegam a casa e transmitem a mensagem aos pais e avós. A nossa mensagem foi entregue com sucesso!”
Para além dos cuidados a ter relativamente à floresta, estes jovens têm também feito um trabalho importante na identificação de ninhos de vespas asiáticas e na sensibilização da população para a forma correta de agir perante estes focos de perigo. Rui Oliveira explica que se “deve avisar a Câmara Municipal e manter a distância. É a atitude mais segura e alguém especializado tratará rapidamente do ninho.”
Em termos gerais, para Fábio Aleixo, de Salreu, este projeto é “uma aposta na prevenção que é algo que não existe muito em Portugal em matérias de fogos florestais. Existe a aposta no combate e depois da tragédia acontecer. Aqui atuamos antes das coisas acontecerem”, considera. E dá o exemplo da identificação de caminhos “que pela sua natureza não estão na cartografia”, representando “mais um contributo” para a prevenção, uma vez que esta “informação adicional servirá para facilitar o combate”.
Este ano, o projeto que termina na próxima sexta-feira, 11 de agosto, envolveu 24 jovens, divididos em temporadas de 15 dias ininterruptos, de segunda a domingo. É um “projeto pequeno mas de dimensão elevada”, acrescenta Fábio, com significativos benefícios para a formação cívica dos participantes. “Os jovens ficam mais despertos para realidades que não conhecem e complementa a sua formação”.
“Vou voltar, é uma boa experiência que aconselho, é positivo. Aprendi e cresci”, transmite o Diogo. “É um processo de aprendizagem, a cada ano que passa vou vendo coisas novas e aprendendo mais”, reforça o Fábio. “É uma boa iniciativa, de grande importância grande para a floresta local”, complementa Edgar. O projeto termina mas o espírito de “guarda-florestal” irá permanecer nas vidas destes jovens. A partir de hoje, “terei outra atitude. Isso vai ficar”, acrescenta o jovem de Canelas, que espera que o projeto continue. “Um dia gostava que os meus filhos participassem.”
Texto: CM