Estudo da UA desvenda comportamento de fluídos à nanoescala.

Um avanço na investigação científica de fluídos à nanoescala, conseguido por investigadores do CICECO-Instituto de Materiais de Aveiro e dos Departamentos de Química e Física da Universidade de Aveiro (UA), foi publicado na prestigiada revista científica Nature Communications.

O escoamento ou o fluxo de líquidos em canais de dimensão nanométrica, isto é, à nanoescala, é um fenómeno essencial em vários processos biológicos e sustenta uma ampla gama de aplicações nanofluídicas em medicina, biotecnologia ou até na conversão de energia.

Geralmente, assume-se que à nanoescala o fluxo é predominantemente laminar, mas os investigadores do CICECO detetaram fluxos de água em forma de hélice até então desconhecidos dentro de nanocanais de peptídeos, coexistindo com os convencionais fluxos laminares.

Os peptídeos são biomoléculas formadas por dois ou mais aminoácidos, que no caso concreto deste estudo são baseados em difenilalanina. Quando colocadas em água, estas moléculas tendem a organizam-se na forma de anéis (com seis moléculas) que por sua vez se alinham sequencialmente formando nanocanais com 1 nanómetro de diâmetro e um comprimento que pode atingir vários centímetros.

Os autores usaram uma combinação de resultados experimentais obtidos por espectroscopia de ressonância magnética nuclear para caracterizar a estrutura da água dentro do nanotubo e de medidas de absorção de vapor de água para avaliar o coeficiente de difusão da água, juntamente com informação sobre a direção do fluxo obtida por simulações computacionais da dinâmica das moléculas de água no interior dos nanocanais.

Este conjunto de estudos permitiu propor um modelo em que o fluxo laminar coexiste com o fluxo helicoidal, mas são independentes um do outro, imiscíveis, propagando-se ao longo do nanocanal com velocidades diferentes.

A trajetória helicoidal do fluxo resulta da distribuição em forma de parafuso (helicoidal) de grupos iónicos funcionais ao longo das paredes do canal peptídico, podendo o fluxo ser controlado pela pressão externa de vapor de água.

Os resultados sugerem, explica o primeiro autor do estudo, o investigador Pavel Zelenovskii, “que fluxos helicoidais análogos podem ocorrer noutros tipos de nanocanais, como por exemplo em zeólitos, que são sólidos cristalinos microporosos com porosidade inferior a 2 nanómetros, usados em catálise ou como peneiros moleculares, ou membranas poliméricas microporosas utilizadas no tratamento de águas, nanofiltração de compostos orgânicos, separação gasosa, pilhas de combustível e baterias”.

A descoberta representa uma nova visão sobre aspetos fundamentais do comportamento de líquidos à nanoescala com relevância para o estudo de fenómenos biológicos como o transporte celular, já que os nanocanais de peptídeos são utilizados como modelo para os canais iónicos transcelulares.

Esta visão nova pode também possibilitar novas abordagens no controle de reações químicas em “laboratórios” miniaturizados (“lab-on-a-chip”) e muitas outras aplicações da nanofluídica, por exemplo na conversão e armazenamento de energia.

O estudo decorreu no âmbito de projetos financiados pela Fundação para a Ciência e Tecnologia, I.P. (FCT), o Conselho Europeu para a Investigação (ERC) e o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR).


Texto e foto: UA