Manuel Godinho, o homem que esteve no centro do processo Face Oculta, foi esta segunda-feira condenado a quatro anos de prisão, com a pena a ser suspensa, por se ter apropriado de um reembolso das Finanças, no valor de 56 mil euros, a uma das suas empresas que se encontrava em processo de insolvência.
Foi considerado culpado no Tribunal de Santa Maria da Feira dos crimes de branqueamento de capitais, abuso de confiança agravado e frustração de créditos. A namorada de um dos seus filhos e uma advogada foram também condenadas, a penas suspensas, por terem disponibilizado contas bancárias para desviar o dinheiro. Esta foi a quarta condenação de Manuel Godinho em processos judiciais, embora nenhum das penas tenha transitado em julgado e o sucateiro continue em liberdade.
O juiz justificou a suspensão da pena pelo facto de, à data dos factos, o arguido não ter antecedentes criminais. Mas os três arguidos têm de pagar, cada um, 3000 euros aos bombeiros de Santa Maria da Feira. O Tribunal declarou ainda perdido a favor do Estado a quantia de 56 mil euros.
O processo resulta de factos ocorridos em 2017, quando o sucateiro de Ovar estava já condenado no Face Oculta e tinha sido declarado insolvente em 2016. Este processo, iniciado pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e com acusação em Santa Maria da Feira, começou com a identificação suspeita de uma ordem de transferência bancária em 13 de janeiro de 2017. Nesta data, um banco comunicou às autoridades, por via das regras de prevenção do branqueamento de capitais, que uma das empresas de Manuel Godinho tinha ordenado a transferência de uma verba para a conta de uma outra sociedade gerida pela namorada de um filho do empresário.
O Ministério Público concluiu que existia um esquema orquestrado para sacar o dinheiro do reembolso fiscal da empresa em insolvência e, através da conta aberta pela namorada do filho e mais tarde pela conta da advogada, o fazer chegar a Manuel Godinho. A acusação referia que Godinho não apresentou qualquer justificação económica para esta operação, que apenas terá servido para o mesmo se apropriar dos 56 mil euros. O tribunal deu os factos como provados e condenou Godinho a quatro anos de pena suspensa. A namorada do filho foi punida com um ano e dois meses de pena suspensa enquanto a advogada foi condenada a três anos de prisão, também suspensos. Os arguidos terão ainda de pagar três mil euros de indemnização que reverterá para os bombeiros locais.
Este é o quarto processo em que Manuel Godinho é condenado, na sequência do Face Oculta. No principal inquérito, o empresário de Ovar foi inicialmente condenado a 17 anos e meio de prisão, depois reduzidos a 15 pela Relação do Porto. O Supremo Tribunal de Justiça acabou por condená-lo a 13 anos de prisão por 44 crimes, incluindo corrupção ativa, burla qualificada, furto qualificado, tráfico de influência, perturbação de arrematações e falsificação de notação técnica. Mas alguns destes crimes, como o de perturbação de arrematações, foram declarados prescritos pela juíza de Aveiro o que implica que a pena terá de ser reformulada em novo cúmulo jurídico. Contudo, o MP recorreu desta decisão de prescrição e é aguardada a decisão da Relação do Porto.
Em novembro, o tribunal de Aveiro condenou Godinho a três anos de prisão efetiva, numa audiência de cúmulo jurídico referente a dois processos que resultaram de certidões extraídas do Face Oculta. Em 2016 Manuel Godinho tinha sido condenado pelo Tribunal de Aveiro a dois anos de prisão efetiva, por um crime de corrupção ativa. Também foi condenado em Beja num processo em que o antigo sucateiro de Ovar foi punido com dois anos e meio de prisão, por ter subornado um ex-funcionário da antiga Refer. O Tribunal da Relação do Porto decidiu suspender ambas as penas, uma delas com a condição de pagar quase 39 mil euros à Refer. A pena efetiva do cúmulo jurídico também motivou um recurso de Manuel Godinho. E assim escapa à cadeia. Armando Vara, Manuel Guiomar (ex-Refer) e João Tavares (ex-funcionário da Galp) são arguidos deste processo que estão atualmente a cumprir penas de prisão.
Além disso, no Tribunal de Bragança decorre outro julgamento que resulta de uma certidão extraída do Face Oculta, e está relacionado com um concurso público para a alienação de 16 lotes de resíduos dispersos por diferentes estações da Refer, atual Infraestruturas de Portugal, em 2009. A empresa é assistente no processo. Além de Manuel Godinho, os outros arguidos são o seu sobrinho Hugo Godinho, a ex-secretária Maribel Rodrigues (ambos condenados no Face Oculta) e o filho Marco Paulo. Entre os restantes arguidos estão colaboradores de Manuel Godinho e Manuel Guiomar, ex-funcionário da Refer, que se encontra a cumprir pena de prisão resultante do processo Face Oculta e aqui está acusado de um crime de corrupção passiva para ato ilícito, além de burla e falsificação de notação técnica.
De acordo com a acusação, uma empresa de Manuel Godinho comprou seis lotes, mas só declarou cerca de metade dos resíduos valorizáveis que foram levantados, causando um prejuízo à Refer de cerca de 87 mil euros. A maior parte do prejuízo, cerca de 54 mil euros, resultou do levantamento dos resíduos depositados nas estações de Tua e Mirandela, realizada em julho e agosto de 2009. A empresa de Godinho declarou ter removido 246 toneladas, mas em consequência da adulteração de pesagens foram efetivamente levantadas 480 toneladas.
Fonte: DN