Estudos de geofísicos da UA no Mosteiro Batalha comprovam métodos de construção da Idade Média. Como é o terreno por baixo do Mosteiro da Batalha? Como são constituídas e como forma construídas as paredes deste edifício incontornável da história e iconografia portuguesas? E quanto às colunas, com são por dentro? Para responder a estes mistérios que agitam arqueólogos e engenheiros civis estudiosos da história da disciplina, geofísicos da Universidade de Aveiro (UA) aplicaram métodos inovadores e não invasivos a esta pérola do gótico português. Já foi possível identificar estruturas possíveis de interpretar como túmulos de localização até agora desconhecida.
Repouso dos monarcas da “Ínclita geração”, nas palavras de Camões, e recentemente classificado como Panteão Nacional, juntando-se à Igreja de Santa Cruz (Coimbra), aos Jerónimos e a Santa Engrácia (Lisboa), o Mosteiro de Santa Maria da Vitória, mais conhecido por Mosteiro da Batalha, ainda encerra segredos, apesar de muito estudado. Alguns poderão estar por baixo das lajes que revestem o solo, outros por detrás das grossas paredes ou na estrutura das colunas de suporte ao enorme vão que chega ao teto da igreja.
O terreno por baixo do lajeado da igreja foi objeto de um estudo 3D, utilizando os métodos de resistividade elétrica, aplicando um dispositivo especialmente desenvolvido para este caso, que implicou a colocação de 50 elétrodos ligados a um resistivímetro e um algoritmo inovador e especialmente desenvolvido para comutação automática dos pontos de injeção e medida de corrente, bem como uma nova metodologia de verificação da qualidade de sinal, explica o coordenador do estudo, Manuel Senos Matias.
O professor do Departamento de Geociências da UA acrescenta ainda que cada elétrodo é constituído por um copo em PVC com lama saturada em água no interior onde é cravado uma estaca de aço. Toda a operação, salienta, foi desenhada para não infligir qualquer dano ao património edificado.
Assim, verifica-se uma área de maior resistividade no centro da abadia que poderá ser interpretada como resultado da compactação decorrente do peso da estrutura do edifício e/ou à acumulação de caboco das fundações do Mosteiro.
A equipa de investigadores estima que o nível freático está a 4,00m/4,30m de profundidade, o que está de acordo com estimativas a partir de observações em poços nas proximidades, e a rocha firme (bedrock) entre 5 a 6 metros, a partir da utilização de métodos sísmicos de refracção. Estes resultados serão apresentados num encontro científico que decorrerá em Barcelona, de 4 a 8 de setembro.
Para além de Manuel Senos Matias, a equipa envolve Fernando Almeida e João Ribeiro, respetivamente, professores e técnico do Departamento de Geociências, Rui Moura, professor da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto, e Nuno Barraca, da empresa Dryas. Fernando Pedro, professor da Universidade de Coimbra, tem colaborado em algumas fases dos trabalhos. Os apoios da Câmara Municipal da Batalha e da Direção Geral do Património têm sido determinantes.
No terreno por baixo da capela sul e à entrada da Abadia, o método de georradar revela manchas de geometria rectangular com orientação este-oeste que podem corresponder a túmulos, explica o coordenador da equipa: “Está preparado o ‘terreno’ para os arqueólogos; para saber mais, será necessário escavar.”
Quanto às paredes, a documentação conhecida apontava para uma estrutura habitualmente usada na construção de edifícios notáveis por duas camadas exteriores de pedra e enchimento no meio. Estes estudos de geofísica permitem agora, e pela primeira vez, reunir provas no terreno e dados concretos que vão ao encontro das suspeitas dos arqueólogos. Os dados recolhidos através de georadar aplicado à parede entre a igreja e o claustro e na parede exterior da Abadia, mostram uma estrutura constituída por duas camadas ou faces de, aproximadamente, 0,50m de pedra e um miolo de cerca de 1,60 de enchimento.
No caso das colunas, os investigadores não eram unânimes quanto à sua constituição: em pedra maciça ou pedra maciça exterior e enchimento no interior. Os dados agora recolhidos nas oito colunas dentro da igreja, mais próximas da entrada poente do Mosteiro, usando um método semelhante a TAC, permitem definir um modelo que, embora preliminar, já mostram uma estrutura externa em pedra ocupando menos de metade da área da coluna, sendo o restante (miolo) ocupado com enchimento.
A equipa tem vindo a compilar dados para um livro que será editado e apresentado na Batalha, assim como a preparar pósteres em grande formato para apresentação no local e mostras itinerantes.
texto e foto: UA