A pintora e escritora Mónica Baldaque, filha da escritora Agustina Bessa-Luís, esteve em Ovar em mais uma edição de “À Palavra no Museu de Ovar” (49º edição) para falar de literatura e da sua obra, como “Vinte anos na província”, um livro de contos editado em 2013, em que fala das famílias tradicionais do Douro.
Tema que inevitavelmente marcaria esta sessão moderada por Carlos Nuno Granja, tratando-se da região em que a autora nasceu a 13 de Maio de 1946, Peso da Régua.
Apesar de um maior número de livros editados a que se assiste atualmente, como lembrou Carlos Granja, a escritora convidada, começou por assumir que, “desgosta-me imenso a transformação do livro”, referindo-se desde logo ao cheiro, ao afirmar que, “os livros hoje já não cheiram a nada” ou que, “o livro já não diz muito aos jovens”. Adiantou mesmo, “não sei se este tipo de literatura não vai desaparecer”.
Independentemente do futuro da literatura, falar com Mónica Baldaque sobre a sua obra literária, com particular enfoque no livro “Vinte anos na província”, foi falar da sua infância e das redações na escola que cedo começou a escrever, despertando assim para a escrita e pintura inspiradas pela paisagem no Douro, que agora lamenta. “O Vale da Régua, que era famoso, está destruído por urbanização agressiva à paisagem, que contrasta com os socalcos das vinhas”.
Esta vivência na província, no Douro, marcou a escrita e a pintura desta artista, mas sobretudo a sua infância, uma vez que a sua mãe, a escritora Agustina Bessa-Luís, “sempre encarou a escrita como uma profissão, por isso a filha era entregue aos avós que viviam no Douro” recordou a convidada deste à Palavra, num revisitar de memórias que incluiu uma “história verídica” da sua adolescência. Uma “história trágica de um vizinho que se atirou ao rio” e que a escritora ao visitar a casa, encontrou “tudo tal e qual o dia em que ele saiu de casa”, reconhecendo que, “foi com essa carga emocional e fantasmagórica que escrevi o livro”, referindo-se à obra “Vinte anos na província”.
O seu percurso como diretora de museus na cidade do Porto a exemplo do Museu de Literatura ou Museu Soares dos Reis, em que um dia, enquanto aluna das Belas Artes numa visita a este Museu, se fixou a contemplar o Jardim das Camélias tendo dito que “haveria de ir viver para ali”, desejo que se concretizou com a sua entrada inicial para os serviços educativos, foi motivo para abordar a necessidade de “formar públicos, ensinar as crianças a ver a arte”, respondendo assim à questão colocada por Carlos Nuno Granja sobre o estado da arte em Portugal.
Mónica Baldaque que assume pintar realismo, acrescentou ainda, “quando escrevo falo muito da paisagem, é como estivesse a pintar”, e foi assim com este quadro de vivências partilhado no Museu de Ovar, que a própria artista convidada foi surpreendida com a profundidade dos laços históricos que unem Ovar e Régua, quando um dos presentes (Joaquim Fidalgo), depois de despertar nas memórias da escritora, as varinas, realçou que a subida das gentes de Ovar até à Régua ainda antes da chegada do comboio se ficou a dever às técnicas da salga de peixe do francês João Pedro Mijolle.
Relação que viria dar origem à geminação entre estas cidades com papel preponderante de João Correia que escreveu “Há Sal na Régua” e que curiosamente tinha sido o médico da família de Mónica Baldaque.
O próximo “à Palavra” assinala a 50ª edição deste evento com o escritor Carlos Ademar no dia 19 novembro.