Pela primeira vez foi observada uma ação combinada das propriedades elétrica e magnética, num mesmo material, à temperatura ambiente.
A descoberta, em que participam dois investigadores do Departamento de Física da Universidade de Aveiro (UA) e do CICECO-Instituto de Materiais de Aveiro, é relatada num artigo publicado na revista Science.
Com este avanço perspetivam-se novos desenvolvimentos para a eletrónica molecular no armazenamento de dados, em dispositivos eletrónicos de baixo consumo e na spintrónica.
A spintrónica é o campo da engenharia que manipula o movimento e os spins dos eletrões no átomo e que permitiu, por exemplo, aumentar tremendamente a velocidade de leitura e escrita dos atuais discos rígidos, uma tecnologia que recebeu o Prémio Nobel de Física de 2007.
Os investigadores e professores da UA Luís Carlos e Rute Ferreira, em colaboração com investigadores do Instituto Charles Gerhardt de Montpellier (Universidade de Montpellier/CNRS) e da Universidade de Coimbra, colaboraram no desenvolvimento de um material molecular emissor de luz que apresenta uma forte ação combinada entre as propriedades magnéticas e elétricas à temperatura ambiente, resultante da associação entre ferroeletricidade e magnetostrição (a deformação da estrutura cristalina do material sob o efeito de um campo magnético). O artigo é publicado na edição de 7 de fevereiro de 2020 da prestigiada revista Science.
Perspetivam-se avanços na eletrónica molecular
Os materiais magnetoelétricos combinam propriedades magnéticas e propriedades elétricas. A possibilidade de induzir sinergias entre estas propriedades, permitindo, por exemplo, controlar uma delas através da outra, confere a estes materiais multifuncionais potenciais aplicações no armazenamento de informação de alta densidade, em dispositivos eletrónicos de baixo consumo, e na spintrónica.
No entanto, explicam os investigadores, “tais aplicações requerem uma forte interação entre as duas propriedades, o que raramente ocorre à temperatura ambiente nos materiais à base de óxidos inorgânicos conhecidos”. Consequentemente, afirmam ainda, “o desenvolvimento de materiais com um forte acoplamento magnetoelétrico representa um enorme desafio, ao nível fundamental e ao nível tecnológico”.
Esse acoplamento, observado, pela primeira vez, num material molecular (cuja estrutura é constituída pela associação de moléculas individuais) à temperatura ambiente, permite alterar a polarização elétrica através da aplicação de um campo magnético, abrindo a possibilidade de materiais moleculares virem a substituir os magnetoelétricos inorgânicos tradicionais (óxidos ou fluoretos).
Daqui, perspetiva-se um importante avanço na eletrónica molecular, através do desenvolvimento de novos sistemas multifuncionais, transparentes, mais baratos e sustentáveis do que os usados na eletrónica inorgânica tradicional, até porque o estudo do acoplamento magnetismo/eletricidade em materiais moleculares é um campo inteiramente por explorar. A descoberta reforça, ainda, a promessa do fabrico de dispositivos flexíveis para eletrónica molecular.
Esta é a décima publicação na revista Science em que participam investigadores da UA.