Artigo de Opinião

O desenvolvimento precisa de investimento. Mas nem todo o investimento representa desenvolvimento.

03.11.202523:24
hospital + ampliação + hotel + hospital Trofa

Nada me move contra o investimento privado como atividade económica particular. Tem toda a legitimidade e espaço para existir e subsistir.
Mas não vale a pena procurar muita argumentação e retórica porque o seu objetivo e a sua finalidade são claros: o lucro e a capitalização do investimento como meta final. Em tudo, diferente do investimento público que gera capital e coesão social e bem-estar comum e coletivo.

É um facto que para haver desenvolvimento é necessário, também, investimento. Só que o investimento em causa (que integra estratégia, planeamento e implementação de políticas públicas e bem-estar social) para promover o desenvolvimento deve ser público porque, desta forma, é o garante de maior equidade, justiça social, mais igualdade e gerador de coesão e inclusão. Em sentido oposto, não é este o papel e a função do investimento privado, nem é a este que se exigem as respostas e a responsabilidade social que cabe ao Estado.
Ao contrário do discurso eleitoralista recente, do chavão usado há algumas semanas, o agitar do fantasma do retrocesso ou da estagnação (a ver vamos o que será reservado para Aveiro nos próximos 4 anos), não há qualquer demérito ou abnegação no investimento privado.
O que não faz sentido é pretender ou fazer crer que é esse investimento privado (agitado aos ventos como se fosse resultado de alguma estratégia de gestão pública, ao caso, municipal) que vai ocupar o lugar do investimento em políticas públicas que promovem (desde que enquadradas com as necessidades e prioridades da comunidade e dos cidadãos) o desenvolvimento a comunidade e do território.
Um privado, legitimamente, investe se tiver mapeado e salvaguardado o retorno do capital aplicado e a viabilidade financeira do investimento realizado.

Por cá, entre tantos proclamados “por Aveiro…” (que mais não são do que “para benefício de poucos”) ou da pose fotográfica da “obra civil” e da respetiva “pazada”, Aveiro não precisa de mais investimento (que não gera desenvolvimento, nem coesão territorial) em Turismo e mais empreendimentos turísticos, quando a cidade tem muito pouco para oferecer, faltam estruturas/serviços e, principalmente, quando a pressão turística retira aos aveirenses o seu habitat, condiciona o espaço público, o custo de vida e a economia local. E isto não é desenvolvimento. É avidez pelo lucro e pelo ‘megalomanismo’. Ou, em alguns casos, pelo egocentrismo absolutista do (ab)uso do poder político.

A massificação turística ou o turismo descontrolado (mais ‘porta escancarada’ que a imigração) cria uma pressão negativa nos territórios: bolhas imobiliárias, desestruturação da economia, gentrificação dos centros urbanos (desertificação das cidades) e sobrelotação das periferias urbanas (com redução de investimento público em transportes, saúde, educação, habitação, serviços e bem-estar).
Já não bastava o surrealismo urbanístico do “monstro de 12 andares” para vermos, recentemente anunciada a construção (nem vale a pena entrar nas questões de arquitetura ou até de planeamento urbano… embora esta seja demasiado relevante) de mais um empreendimento turístico em plena zona nobre da Cidade (zona da Fonte Nova, onde até já existe oferta instalada).
Se isto é investimento? É, de facto, investimento… privado.
Serve Aveiro? Todas as dúvidas, mas, acima de tudo, serve os interesses (legítimos, obviamente) económicos do investidor e serve para um aumento da pressão turística na cidade.
É desenvolvimento? De todo e de forma alguma. Não traz mais “cidade”, mais envolvimento dos aveirenses, mais vivência do espaço público. E numa conjuntura de crise profunda na habitação (no aceso à habitação), onde, em 20 anos, nada se fez para combater (ou ajudar a combater) esta crise e desestruturação social e económica, Aveiro perde mais uma oportunidade para se projetar e estruturar as necessárias e urgentes respostas públicas à crise habitacional.

Por falar em ausências de políticas públicas na habitação, o mesmo podemos afirmar em relação à saúde.
Após vários anos volvidos sobre a necessidade de requalificação e valorização do Hospital de Aveiro, tantas laudes eleitorais a quase nada, tantas contradições e desmentidos, deveria preocupar o Poder Local e os aveirenses a estagnação e o impasse (mais uma vez) do investimento público na saúde em Aveiro (já nem entro na discussão se ampliação, reabilitação ou construção de raiz noutro local), a falta do projeto/estudo, a ausência da referência ao Hospital no Orçamento do Estado para 2026 e do desaparecimento da narrativa e planeamento governativos. O Hospital de Aveiro perde, novamente, a sua prioridade e referência. Mas não… essa preocupação seria boa demais.
Perante falta de peso político de Aveiro a nível regional e nacional (afinal a mesma cor política não parece trazer benefícios), a ausência de estratégia de um plano de desenvolvimento público consistente, resta a “pazada da primeira pedra” de um investimento privado na saúde.
É investimento? É. Facto.
É desenvolvimento? Nem por isso… é a desresponsabilização e o desinvestimento numa área que deveria ser responsabilidade social do Estado como forma de garantir uma saúde acessível a todos, que não exclua e que não cave um fosso maior nas já preocupantes desigualdades sociais que o país atravessa. E mais uma vez, o Hospital de Aveiro entra na gaveta da indiferença.

Nem sempre o investimento significa desenvolvimento. O que se espera é que Aveiro se desenvolva de forma coesa, sustentável e socialmente responsável. Isso depende de investimento… público.