Pode haver uma relação direta entre a exposição a produtos tóxicos e o desenvolvimento de estados de demência como a doença de Alzheimer.
O aviso é de um estudo pioneiro de uma equipa de investigadores da Universidade de Aveiro (UA) que indica que quanto maior for a presença de elementos potencialmente tóxicos no organismo pior será o desempenho cognitivo.
Realizado com um grupo de idosos de Estarreja, o trabalho da UA vai mais longe: os participantes com demência foram mesmo os que tinham no organismo valores mais elevados de alguns metais, como o alumínio e o cádmio.
Coordenado pelas investigadoras Marina Cabral Pinto e Paula Marinho Reis, da unidade de investigação Geobiociências, Geoengenharias e Geotecnologias (GeoBioTec) da UA, a investigação pretendeu esclarecer o nível de impacto que a exposição ambiental a elementos potencialmente tóxicos tem no desempenho cognitivo. Para tal, foi escolhido um grupo de mais de 100 adultos e idosos, com uma idade superior a 55 anos, e residentes permanentes em Estarreja, uma cidade inserida numa área industrializada.
Alumínio, cádmio, cobre, chumbo, zinco e mercúrio foram alguns dos elementos químicos que as investigadoras analisaram na urina, sangue e cabelo dos cem participantes no estudo e aos quais foram realizados vários testes cognitivos.
“Verificou-se que os participantes com pior desempenho cognitivo, equivalente a um estado de demência, apresentavam valores mais elevados de alguns elementos potencialmente tóxicos”, aponta Marina Cabral Pinto. No entanto, diz a investigadora, “para já esta é uma relação que resulta apenas dos modelos estatísticos obtidos e é necessário garantir que não se trata de um resultado fortuito”. Por isso, os dados até agora obtidos “indicam que esta é uma linha de investigação que vale a pena desenvolver, mas que investigação adicional é efetivamente necessária”.
Apesar do vasto investimento científico e dos muitos progressos conseguidos pela comunidade científica, a demência continua sem ter um tratamento curativo e as causas deste declínio cognitivo não são totalmente conhecidas.
“Apenas uma reduzida percentagem dos casos clínicos tem etiologia genética, enquanto a larga maioria tem uma origem esporádica”, lembra Marina Cabral Pinto. Para além da idade, diversos outros fatores, incluindo a exposição ambiental a elementos potencialmente tóxicos, “têm sido sugeridos como estando associados ao aumento de risco de desenvolvimento de demência e da doença de Alzheimer durante o envelhecimento”.
Para além de Marina Cabral Pinto e Paula Marinho Reis e, da UA, a equipa de investigadores integra também Sandra Freitas, Mário Simões e Paula Pinto (Centro de Investigação em Neuropsicologia e Intervenção Cognitivo Comportamental (CINEICC), Paula Moreira (Centro de Neurociências e Biologia Celular), Agostinho Almeida e Luísa Diniz (Laboratório de Química Aplicada da Faculdade de Farmácia da Universidade do Porto), Carlos Ordens (University College London, na Austrália) e Teresa Condesso de Melo (Instituto Superior Técnico).
Este projeto exploratório foi financiado pelo DRIIHM-Labex, French programme "Investissements d'Avenir". Atualmente a equipa de investigação da UA está a tentar conseguir financiamento que permita continuar a investigação iniciada.
Recentemente, o grupo de investigação celebrou uma parceria com a Universidade de Cabo Verde para um novo projeto nesta área de investigação, a realizar nalgumas ilhas de Cabo Verde.
“A realização do projeto em Cabo Verde vai ser muito importante pois temos ilhas com maior potencial de exposição, como a ilha de Santiago, mas temos outras em que não há fontes de poluição conhecidas, como a ilha do Maio, por exemplo”, antecipa Marina Cabral Pinto. Será “muito interessante, verificar se há ou não diferenças no desempenho cognitivo dos idosos em ambientes tão diferentes”.
“Acreditamos que uma nova plataforma de dados que combine dados geoquímicos, epidemiológicos, sociológicos, neurológicos e neuropsicológicos possa melhorar a nossa compreensão da relação entre a exposição ambiental e os fatores promotores do declínio cognitivo”, concluem as investigadoras.
Texto e foto: UA