No ano de 2017, a FAO (organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura) estimou que a fome afetou cerca de 815 milhões de pessoas em todo o mundo, um aumento significativo em relação ao ano de 2015, quando eram cerca de 770 milhões as pessoas atingidas pela fome, afirmou a diretora-geral adjunta da FAO, Maria Helena Semedo, responsável pela área do clima e recursos naturais daquela organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura, falando durante a primeira sessão plenária da Conferência Internacional de Ambiente de Língua Portuguesa (CIALP) que decorreu desde 8 e terminou a 10 de maio, na Universidade de Aveiro (UA).
Esse aumento da fome acontece apesar do “direito à alimentação ser um direito já consagrado em algumas constituições, nomeadamente na brasileira”. A diretora-geral adjunta da FAO aponta como causas do aumento da fome global questões como “os conflitos”, “as alterações climáticas e os eventos atmosféricos extremos” e o “abrandamento económico e o seu impacto nas políticas de proteção social”. No entanto, Maria Helena Semedo reconhece que “há alimentos suficientes para toda a humanidade”, estão é “mal distribuídos” e a falta de recursos económicos impede que as populações mais pobres os possam adquirir.
Ao mesmo tempo em que milhões de pessoas passam fome, “a qualidade nutricional e a alimentação desequilibrada” provoca doenças, que que é exemplo a diabetes, o que acarreta investimentos em sistemas de saúde para minorar esses efeitos, nomeadamente a obesidade.
No presente, cerca de 1,2 biliões de pessoas vivem no limiar da pobreza e, dessas, cerca de 750 milhões são agricultores que vivem na África subsariana, no sul e no leste da Ásia.
Se os conflitos são provocados pelo homem, também as alterações climáticas o são, tendo como efeitos, que ocorrem um pouco por todo o mundo, as chuvas intensas, inundações, secas prolongadas, elevação do nível do mar, entre outros, os quais têm impactos na vida marinha, na biodiversidade, na agricultura e na pesca. Esses impactos negativos já são visíveis na redução mundial da produção de trigo e de milho, bem como no aumento dos incêndios florestais.
Impacto das alterações climáticas na agricultura
Maria Helena Semedo não tem dúvidas em afirmar que “as alterações climáticas são uma realidade”, e que a “temperatura está a aumentar e esse aumento é causado pelo homem”, pelo que “se não mudarmos de paradigma, os humanos, os animais e as plantas não poderão viver”.
Nesse sentido, “há medidas que incentivam os agricultores, principalmente os europeus, a serem mais amigos do ambiente”, até porque “a contribuição dos sectores agrícolas para as alterações climáticas é da ordem dos 20%” no aumento dos gases com efeito estufa, pelo que se aposta em “novos tipos de alimentação pecuária com menos efeitos de gases” e em fertilizantes naturais mais amigos do ambiente.
Para minorar os efeitos das alterações climáticas, a FAO defende que os países pobres têm de ter acesso a financiamentos específicos, ao mesmo tempo que é “necessário que cada um de nós contribua”, porque “todos nós temos um papel a desempenhar”
“Produzir mais com menos”
As perspetivas futuras não são muito animadoras, uma vez que, como refere Maria Helena Semedo, em 2050, a população mundial será de 9 a 10 biliões de pessoas, das quais cerca de 70% viverão em cidades, altura em que haverá menos água, mas em que os solos estarão mais degradados, pelo que será necessário “produzir mais com menos”, até porque também haverá menos gente a viver zonas rurais e disponíveis para a agricultura.
Com o aumento da população citadina, aumenta também o consumo de carnes e de produtos alimentares processados, pelo que “temos de mudar o nosso sistema de consumo para um mais sustentável e amigo do ambiente”, defende a dirigente da FAO, até porque, como afirma, “consumimos cerca de sete tipos de produtos. Temos de voltar a consumir produtos esquecidos”, bem como consumir “menos carne” nos países onde ela é consumida em excesso.
Especialista em desenvolvimento global
Maria Helena Semedo é natural de Cabo Verde, com formação académica em Portugal. Em Cabo Verde, assumiu o cargo de Ministra das Pescas e Agricultura, tendo sido também Ministra do Turismo, Transportes e Assuntos Marinhos. Após a sua entrada para a FAO, foi a sua representante no Níger e, mais tarde, diretora da FAO para a África. Atualmente, é diretora-geral adjunta da FAO para o Clima e Recursos Naturais.
Texto e foto: UA