Um estudo da Universidade de Aveiro (UA) conclui que a produção de serradela em aquicultura associada à produção intensiva de peixe origina minhocas mais ricas nutricionalmente e em maior quantidade, contribuindo para eliminação do excesso de matéria orgânica particulada na água que resulta da produção piscícola.
A serradela é um dos principais iscos na pesca e é usada para alimento dos peixes em aquicultura. As conclusões constam do artigo científico com o título “Adding value to ragworms (Hediste diversicolor) through the bioremediation of a super-intensive marine fish farm” destacado como “Feature Article” no periódico “Aquaculture Environment Interactions” de fevereiro.
As vantagens da chamada aquicultura multi-trófica integrada, que pressupõe a montagem de um sistema integrado de cultivo de diferentes espécies caraterísticas de distintos nichos da cadeia alimentar que tem vindo a ser desenvolvido no âmbito do ECOMARE - Laboratório para a Sustentabilidade dos Recursos Marinhos.
Desde logo, a possibilidade de se produzirem várias espécies com valor comercial apenas suportado com o custo do alimento para uma só espécie e com a vantagem acrescida de obter um efluente final mais limpo são duas vantagens a considerar.
Nestes estudos, a prioridade tem sido dada a espécies autóctones e adaptadas às condições da Ria de Aveiro. São o caso das plantas halófitas (caraterísticas de ambientes salinos) e macroalgas, que assimilam da água os compostos inorgânicos ricos em fósforo e azoto que resultam da produção de peixe, e animais filtradores, como ostra, berbigão e ameijoa, que consomem partículas de matéria orgânica mais pequenas, ou ainda outros seres vivos, como poliquetas (caso da serradela) e pulgas-do-mar, que consomem partículas de matéria orgânica maiores.
Nessa linha, um artigo científico publicado no periódico “Aquaculture Environment Interactions” de fevereiro e assinado pelos investigadores da UA, Bruna Marques, Ana Isabel Lillebø, Fernando Ricardo, Cláudia Nunes, Manuel A. Coimbra, Ricardo Calado, divulga um estudo sobre a produção aquícola de serradela, Hediste diversicolor, em articulação com a produção de peixe. Este artigo, que decorre do trabalho de doutoramento de Bruna Marques, mereceu uma atenção especial do editor do periódico tendo sido destacado como “Feature Article”.
O estudo experimental realizado na empresa Aquacria Piscícolas em três tanques de um metro quadrado cada um em que passava a água proveniente da produção de peixe (linguado), mostrou um aumento de 200 indivíduos por metro quadrado para sete mil em apenas cinco meses.
Ricardo Calado, um dos orientadores deste trabalho de doutoramento, investigador do Centro de Estudos do Ambiente e do Mar (CESAM) e do Departamento de Biologia (DBio), salienta que, para além do grande aumento do número de indivíduos, se verificou que a serradela assim produzida contém DHA, ácido gordo que aumenta o valor nutricional destas minhocas.
Por isso, estas tornam-se produto premium que pode ser usado para o alimento de camarão ou peixe em situações especiais, como no caso da maturação de reprodutores.
Na base do estudo, explica também Ricardo Calado, está o conceito da economia circular, contribuindo para manter os nutrientes dentro do sistema produtivo e evitar a sua perda para o ambiente.
O investigador chama a atenção para as perdas de nutrientes que se verificam na aquicultura convencional, mesmo nos casos em que a prática está mais amadurecida, como na produção de salmão, e que pode chegar aos 20 por cento.
A aluna Bruna Marques, primeira autora do estudo publicado, é uma de quatro alunos de doutoramento orientados pelos investigadores do DBio e do CESAM, Ana Isabel Lillebø e Ricardo Calado, cujas dissertações abordam o desenvolvimento de novos processos e produtos no âmbito da aquacultura multi-trófica integrada.
Todos os trabalhos em curso têm sido articulados com empresas aquícolas da região, nomeadamente a AlgaPlus, a RiaSearch e a Aquacria Piscícolas. Esta proximidade com o setor produtivo visa promover uma mais rápida validação da tecnologia e uma transferência de conhecimento mais eficiente da UA para as empresas aquícolas nacionais, contribuindo assim para o desenvolvimento da economia do mar.
Texto e foto: UA