Raul Martins avisa que estratégia do PS vai acabar num “regresso de uma qualquer troika”.

Raul Martins confirmou nas últimas horas os motivos da desfiliação do PS e não esconde que o rumo da governação de António Costa é o foco da cisão pela crescente influência dos partidos de esquerda nomeadamente do Bloco de Esquerda.

O antigo presidente da concelhia confessa sentir que já não tem “ânimo nem vitalidade para, antes que a barca venha, conseguir ajudar a alterar o rumo que, desafortunadamente, o PS vem a prosseguir”.

Diz que a estratégia económica e social do partido, assente no crescimento económico apoiado no consumo público e privado, relegando para segundo plano o investimento e as exportações, é um erro que vai ser pago a prazo.

Acredita mesmo que a estratégia seguida vai acabar num “regresso de uma qualquer troika”, nomeadamente “quando se verificar a normalização da política monetária que o Banco Central Europeu vem a adoptar”.

“O problema apresenta ainda, a meu ver, uma maior gravidade quando se verifica que o aumento da despesa pública corrente tem sido feito à custa do aumento de uma carga fiscal que atingiu um patamar brutal e o consumo privado se tem baseado na diminuição do nível das poupanças e, pior do que isso, no crédito, que está a gerar uma bolha que, mais dia menos dia, vai rebentar”.

O antigo dirigente e professor no ISCA vê nas políticas seguidas uma abordagem a pensar em eleições mas sem cuidar do médio e longo prazo.

“Para garantir, no curto prazo, alguns resultados políticos eleitorais, estamos a esbanjar a oportunidade de construir um futuro melhor para os nossos filhos. E escusam de nos vir dizer que as perspetivas das agências de rating sobre a dívida portuguesa sobem ao sabor do aumento dos combustíveis porque já todos sentimos na pele como tudo isso rapidamente se altera. Basta um espirro da economia mundial ou uma pequena alteração na política do BCE”.

A gestão política das alianças com PCP e BE é outro dos focos do desconforto por notar “crescente parasitismo político” por parte do BE, que “apregoa aos sete ventos que todas as medidas, mesmo que desacertadas, que têm tido aplauso público a eles se devem e culpa o PS de todas as medidas menos populares que, obviamente, a governação de um País exige que sejam tomadas”.

O caso das nomeações de familiares também surge na lista de argumentos para a cisão. “Não que nos outros partidos e Governos não exista, ou tenha existido entre todos aqueles cuja vida começa e acaba no partido, um elevado grau de endogamia baseada nas amizades íntimas, matrimónios ou consanguinidade. Não só porque, o nível a que chegou, pode gerar conflitos de interesses nas “guerras” pelos recursos, sempre limitados, do Orçamento do Estado definidos no Conselho de Ministros a que alguns pertencem (ou podem fazer lobby familiar), mas essencialmente porque o PS sempre se arrogou de ser o bastião da Ética Republicana à qual não basta o simples cumprimento da lei em vigor. Ética Republicana que, aliás, reconhece que a criação de uma oligarquia endogâmica é o patamar do aparecimento das tiranias”.

Quanto à relação com a concelhia, afirma que se mantém como apoiante de Manuel Sousa mesmo não concordando com todas as posições. E deixou um “aviso de amigo”.

“Mas aproveitei para lhe aconselhar alguma precaução pois os poderes ocultos que governam (ou julgam governar) o partido em Aveiro não deixarão de lhe dar o bote quando acharem que poderá embaraçar a evolução das suas vidinhas ou uma eventual mudança nos destinos políticos locais (cuja dificuldade é óbvia e exige todo o esforço e dedicação para que muitos não estão disponíveis) o tornarem descartável".

 

foto: Diário de Coimbra